Compliance traz vantagem competitiva

Sergio Adeodato /Para o Valor, de São Paulo
Após o escândalo da compra de votos de políticos no esquema do Mensalão, com o maior debate na sociedade sobre a urgência de se reduzir práticas ilegais, as empresas se uniram em torno de um pacto inédito, anunciado em 2006, visando um mercado mais justo e ético. A lei anticorrupção, aprovada oito anos depois para punir não apenas as pessoas, mas também as corporações, intensificou esforços de compliance sob o risco de multas milionárias — engajamento que cresceu no rastro da operação Lava-jato. Hoje, com mais de quinhentos signatários, a aliança se vê diante de novas demandas, alvo de uma segunda ação coletiva: o Movimento Empresarial pela Integridade e Transparência, recém-lançado pelo Instituto Ethos com pro- postas para aprimorar a relação público-privada e avançar na agenda.
Para o consultor Jorge Hage, especialista no tema, “as empresas que adotam práticas éticas devem influenciar o ambiente externo a fazer o mesmo, de mo- do a não ficarem em desvantagem competitiva”. É preciso, segundo ele, exigir igual engajamento por parte de fornecedores e clientes na cadeia de negócios: “A pressão de mercado é mais eficiente do que a imposição legal de cima para baixo”. Em sua aná lise, a expansão dos compromissos requer mudanças na Lei 12.846/2013 capazes de incentivá-los, como por exemplo a atenuação de multas ao se compra- var a existência de programa de compliance.
A questão compõe a lista de propostas ao poder público elaborada pelo novo movimento empresarial, abrangendo itens como a criação de um marco regulatório de compras e contratações governamentais que reconheça os esforços privados em transparência e combate à corrupção, além da obrigação de ações de integridade para partidos políticos. “A iniciativa aprofunda o debate e indica aperfeiçoamentos da legislação”, afirma Marina Ferro, gerente executiva de práticas empresariais e políticas públicas do Ethos.
“Há muito por fazer e o papel das empresas é essencial reforça Guilherme Donega, consultor da Transparência Internacional (TI), organização que em 2017 colocou o Brasil em 99º lugar entre os 180 países do ranking mundial da corrupção. Ao mesmo tempo, recente pesquisa mostrou que para 83% dos brasileiros o cidadão comum pode fazer a diferença no combate ao problema. Na campanha Unidos contra a Corrupção, recém-lançada no Brasil junto com a Fundação Getúlio Vargas, apresenta setenta novas propostas legislativas e regulatórias de mudanças visando o debate eleitoral.
De acordo com Donega, o desafio “não deve ser visto como a luta do bem contra o mal,  mas como uma questão de desenvolvimento econômico, porque não há concorrência justa ou investimento em inovação quando no fim do dia ganha quem pagar a maior propina”. O Fórum Econômico Mundial estima o custo da corrupção em US$ 2,6 trilhões por ano, ou 5% do Produto Interno Bruto (PIB) global — recursos desviados que deixam de ser investidos em melhorias de vida. “A polarização global com disputas de vários tipos não ajuda na luta contra a corrupção”, adverte Renato Capanema, secretário do Ministério da Transparência e Controladoria Geral da União (CGU), ao lembrar que é essencial achar plataformas de diálogo.
Mais da metade das exportações mundiais vêm de países que não punem a propina, em desacordo com a Convenção Antissuborno da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). “Queremos dar visibilidade positiva ao produto brasileiro no exterior”, diz Claudio Torquato da Silva, chefe de controle interno do Ministério da Agricultura, que no selo Agro+Integridade diferenciará no mercado as empresas com iniciativas contra a corrupção. Uma cultura mais madura neste campo já poderia ter evitado problemas paralelos como desmatamento e relações precárias de trabalho no agronegócio: “O atual objetivo é fazer os critérios chegarem aos fornecedores”, ressalta Luiz de Mendonça, presidente da Atvos, produtora de bioenergia servida por 520 mil hectares de cana, sendo 220 mil nas mãos de parceiros.
“De nada adiantará mudarmos internamente se lá fora continuar igual”, avalia Sérgio Leão, diretor de sustentabilidade da Odebrecht. Após o escândalo de corrupção denunciado pela Lava-Jato, a empresa pediu desculpas publicamente e a partir de 2016 iniciou nova política de governança com rígido controle e avaliação de riscos. “É necessário buscar o espírito de integridade e não somente fazer o correto porque estamos sendo auditados”, completa Everson Bassinello, diretor de auditoria e compliance da Braskem.
Envolvimento da alta diretoria é essencial
Os inúmeros casos de corrupção divulgados nos últimos anos no Brasil estimularam empresas públicas e privadas a estabelecer ou aperfeiçoar seus mecanismos de compliance. Mas a sociedade, os investidores, os parceiros comer- ciais é o público interno se convencem que essas regras são para valer? Na opinião de Anna Lygia Rego, diretora para questões legais da Standard & Poors América Lati- na e especialista no tema, a resposta é negativa, na maioria das vezes.
“O compliance é visto como discurso etéreo. Nenhuma, empresa vai dizer que é contra e ninguém acredita que o discurso virou prática”, afirma. Para ela, a alta direção das companhias precisa demonstrar, com elementos concretos, que negócios de interesse da empresa podem não ser feitos se ferirem o código de conduta.
Renato Capanema, diretor da Secretaria da Transparência e Controladoria Geral da União, diz que o compliancê não serve para estabelecer regras, uma vez que a maioria das infrações já é estabelecida em lei, mas para mudar o comportamento das pessoas. O papel da alta direção das companhias é fundamental nesse processo, dando o exemplo,  inclusive no comportamento pessoal. “Não adianta ter discurso ético e furar fila ou comprar produto pirata”, diz.
Para Capanema, as companhias investem em áreas internas de compliance que ficam isoladas e não interagem com o todo. Isso não transforma comportamento; as empresas precisam se transformar em ambientes em que os funcionários se sintam confortáveis para fazer a coisa certa, diz ele. Nenhuma outra empresa brasileira esteve tão no centro das denúncias de corrupção nos últimos anos como a Petrobras. Marcelo Bragança, diretor executivo da rede de postos da Petrobras Distribuidora, diz que o sistema Petrobras, que envolve a petroleira e suas subsidiárias, embarcou em um processo de transformação apoiado em três pilares: estrutura adequada de recursos e pessoas para o compliance; liderança intolerante a desvios e supervisão continua, com aprimoramento em todas as áreas do negócios.

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